quarta-feira, 21 de outubro de 2015

Atualidade do Cristianismo Gnóstico - Uma introduçao





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Introdução

Defrontamo-nos com o desafio de trazermos aqui algo completamente novo e desconhecido para a grande maioria dos “homens de boa vontade” - aqueles que ainda tem ouvidos para ouvir - quer sejam humanistas, religiosos ou esotéricos, como também apresentarmos um conhecimento essencial às atuações apropriadas frente a crise global de limite de consciência, já em franca manifestação e recrudescimento, pela qual a humanidade está passando.
O Cristianismo Do Princípio

O Cristianismo Gnóstico do princípio é na verdade a interpretação profunda, essencial e absolutamente original do cristianismo, com uma teologia, uma cristologia, uma prática RELIG-iosa e uma organização (melhor dizendo uma “holo-organização”), fundamentalmente diferentes da visão hierárquica de poder e obediência proto-ortodoxa e, sendo assim, será no mínimo uma surpresa para os que se dispuserem a conhecê-lo.

É um fato comprovado por estudos acadêmicos objetivos, que o cristianismo desde o primeiro século existia em suas vertentes gnósticas em grande destaque e contingente de seguidores, convivendo com os ramos proto-ortodoxos.

Evidentemente havia litígios entre essas correntes que, no entanto, permaneciam mais em um nível ideológico de disputa (Veja a vasta obra anti gnóstica dessa época do Bispo Irineu de Lyon e veja também a obra da mesma época do gnóstico Bispo Valentino de Alexandria.)

Esse contexto está muito bem exposto num clássico: “Os Evangelhos Gnósticos” da historiadora americana Elaine Pagels.

A ortodoxia se tornou dominante quando ganhou poder imperial - o poder romano - a partir do século IV com a conversão do imperador Constantino. Desde então rompeu-se, pela intimidação, desinformação, perseguição e aniquilação, qualquer possibilidade de convívio entre essas duas correntes.

O Cristianismo Gnóstico embora nunca tenha deixado de se manifestar nesses dois mil anos foi historicamente - mas não espiritualmente - derrotado. Por isso a denominação “cristianismo” passou a se referir exclusivamente às percepções, interesses materiais, disposições doutrinárias, dogmas, conquistas políticas e militares da instituição romana que assim se consolidou.

O Catarismo 


Como grande destaque, surge um movimento cristão dualista de ascese extrema na Europa Ocidental entre os anos de 1100 e 1200, estreitamente ligado aos bogomilos da Trácia. O movimento foi tão forte no sul da Europa e na Europa Ocidental que a igreja Católica Romana passou a considerá-lo uma séria ameaça à religião ortodoxa e culminou por dizimá-lo numa cruzada conduzida pela igreja romana e pelo rei da França. 

Mostrou-se assim na história que a pretensão gnóstica pela pureza  transcendente de um "novo homem divino" não é uma mera utopia pois na verdade já aconteceu na história da humanidade. Durante quase duzentos anos floresceu a Civilização Cátara cujos sacerdotes professavam um cristianismo original puro com a profunda influência do gnosticismo dos primeiros tempos. 

Sob a influência da emanação Sagrada e Pura da Igreja Cátara estabeleceu-se uma nação que se tornou a civilização culturalmente mais avançada da Europa naqueles tempos.

Nessa civilização a mulher, tal como Maria Madalena nos evangelhos gnósticos, podia praticar o sacerdócio cátaro em igualdade de condições com o sacerdócio masculino. Esse avanço doutrinário se refletia na prática social, sendo a liberdade da mulher um dos avanços mais significativos dessa sociedade, fazendo, por exemplo, que ela pudesse, inclusive, tomar a iniciativa do divórcio.

O dualismo doutrinário cátaro distinguia bem as coisas de César (o “Príncipe desse Mundo", Authades, o Demiurgo) das coisas de Deus, e, dessa forma, não interferia, por exemplo, em práticas inerentes ao comércio. Sendo assim a classe dos comerciantes pode dinamizar muito suas atividades com a aceitação da remuneração dos empréstimos.

Os senhores feudais, sem mais poder contar com o conceito de "direito divino", conceito esse quebrado pela doutrina da reencarnação professada pelos cátaros, tiveram seu poder relativizado. Com isso sua atuação ficou bem mais balizada, tornando-se assim menos arbitrários e até mesmo uma força ativa na defesa de sua civilização na guerra empreendida pela ortodoxia romana.

Essa situação ameaçou tão profundamente a hegemonia do poder romano que o Papa Inocêncio III deflagrou o que foi a primeira cruzada empreendida contra outros cristãos - a Cruzada contra os Cátaros - dizimando essa civilização.

A Reforma Protestante 

Assim também, a Reforma Protestante, que partiu de uma atitude corajosa de grande integridade e idealismo de Martinho Lutero, foi logo absorvida por interesses políticos e econômicos seculares da nobreza alemã.

O protestantismo nunca sequer tentou buscar reformulações profundas a partir das bases transcendentes do cristianismo do princípio e sendo assim não logrou produzir nenhuma modificação fundamental em sua teologia. Além disso, quanto à prática, logo no início empreendeu pelos próprios seguidores de Lutero (com sua desaprovação) comandados por  Thomas Münzer uma carnificina que não deixou nada a dever aos piores momentos da inquisição católica.

Os limites da civilização cristã ocidental desviante

Vivemos esses dois mil anos numa civilização (com exceção de pontos luminosos como os Cátaros) construída sobre os fundamentos desse “cristianismo” e que agora nesse século se esgota. 

Desse modo estamos nos confrontando com os problemas globais resultantes das profundas contradições teológicas, morais e ecológicas, frutos do ocaso dessa “civilização judaico/cristã”.

Nesse vácuo vem crescendo a influência de um grupo organizado de militantes do fundamentalismo reducionista materialista, tais como Richard Dawkins e Daniel Dennett, que sob uma retórica cientificista de fachada (sem nenhuma base histórica e experimental) vem se aproveitando da fraqueza teológica dos conceitos e práticas das igualmente fundamentalistas e reducionistas religiões tradicionais, particularmente desse referido “cristianismo”, logrando assim espaço para propor a sua suprema trindade ateísta: “Nada-Caos-Acaso”, como base para a construção de um novo fundamento ideológico do mundo da vida e da conduta moral.

O leitor também poderá se defrontar com o desmascaramento da fragilidade e da parcialidade desses argumentos materialistas ao assistir a obra do atual acadêmico e líder relig-ioso Junguiano, professor da UCLA e Bispo Gnóstico, Stephan Hoeller

O Cristianismo Gnóstico

Certamente a maioria dirá que entende gnosticismo mais ou menos como algo que se refere a uma relação mais íntima que teria havido entre Jesus e Maria Madalena e sua eventual descendência ou a outras especulações desse tipo. Os que percebem desse modo estão se referindo à “gnose-Dan-Brown” que certamente não tem nada a ver com gnose alguma. Aliás Dan Brown é um escritor profissional e não deve mesmo ter nenhum outro compromisso a não ser com sua imaginação de ficcionista.

Mas há algo que deve ser observado com atenção na fenomenal aceitação de seu livro, pois que caracterizou, ainda que de modo profundamente subconsciente, uma demanda coletiva atual, aquariana, por uma nova perspectiva em relação aos exauridos rótulos da cultura cristã ocidental.

No final da primeira metade do século XX um dos achados arqueológicos mais importantes do século acabou por resgatar a importância de uma profundidade espiritual reprimida e escondida por mais de um milênio. Num lugar desértico do Egito foram achadas cópias do sec. IV, agrupadas em códices, de escritos do cristianismo gnóstico primitivo, a maioria deles já há muito considerada perdida. Recuperou-se assim um tesouro: a biblioteca de Evangelhos Gnósticos de Nag Hammadi.

 Após décadas de mirabolantes episódios (dignos de um roteiro de Dan Brown) que atrasaram sua divulgação nos quais a vaidade dos intelectuais então envolvidos foi um dos fatores destacados, os manuscritos foram finalmente divulgados em sua totalidade, a partir da década de 70. Uma nova geração de intelectuais passou então a ser a grande responsável pela divulgação e reconhecimento da importância e do caráter altamente revolucionário que o material trazia na compreensão histórica e teológica do cristianismo em suas origens e fundamentos, até então distorcidos e obscurecidos. E aqui sim, já podemos falar numa gnose: a “Gnose Acadêmica”.

É a Gnose Acadêmica que nos permite hoje afirmar de forma incontestavelmente objetiva que o cristianismo gnóstico não é uma elaboração tardia entremeada de retalhos, feita a partir de ideias helenistas e de outras origens “pagãs’ acrescentadas posteriormente ao pré existente “verdadeiro cristianismo”, mas sim uma prática cristã autêntica professada por um significativo número de pessoas desde os primeiros momentos da manifestação crística do primeiro século concomitantemente com as  formações ortodoxas.

Além disso, ao invés de uma mal alinhavada colcha de retalhos teológica, a percepção e a prática gnóstica se mostraram, sob uma análise metodológica especializada e criteriosa, como um sistema poderoso, profundo, coerente e integrado de ideias e práticas espirituais que ao mesmo tempo que compreendiam e potencializavam os grandes arquétipos das culturas religiosas anteriores, também os colocavam sob o enfoque absolutamente novo e revolucionário que caracteriza a especificidade da autêntica e profunda revelação do cristianismo. 

No entanto a Gnose Acadêmica se limita a elaborar estudos e conclusões dentro dos cânones reducionistas da prática científica. Não tem amplitude, por exemplo, para considerar como causa de uma autêntica manifestação gnóstica uma revelação subjetiva intensa e transformadora.

Não cabe nela nada de transcendente!

Assim considera tão somente um processo construtivo feito pela seleção de influências e conhecimentos de várias fontes que por fim, quando devidamente amadurecidas, se estruturam num produto final organizado, numa tese, numa doutrina. E só aí se pode academicamente falar no surgimento da gnose.

É claro que não são desconsiderados os “insights” intelectuais criativos, desde que tão somente como contribuições coadjuvantes de um estado mental particularmente preparado, bem dotado e atento. 

Não parece, no entanto, razoável imaginar que alguns marceneiros, pescadores, cobradores de impostos, médicos, comerciantes, artesãos, e até (como dizem as más línguas ortodoxas) prostitutas, formassem um grupo apto intelectualmente a produzir algo acadêmico-filisófico da profundidade abrangência e dimensão histórica do cristianismo, mesmo do ortodoxo.

Certamente, alguma coisa aconteceu primeiro. 

Antes e bem acima de qualquer pesquisa, teologia, elaboração de doutrina ou de qualquer denominação, algo devastadoramente intenso, transcendente, gerou nesse grupo uma profunda transformação de consciência - não estou falando aqui de erudição ou intelectualidade, estou falando de Cons-Ciência. E é só assim considerando que chegamos à Gnose na sua verdadeira dimensão:

A Gnose Espiritual, Sagrada

E essa Gnose se refere à determinação do espaço do Divino, do Sagrado, assim como ao estado e ao papel de nossa limitada e exaurida consciência egóica atual quando enceta o processo de re-lig-ação ao seu estado original.

Já é o tempo do Limite e da Crise global. 

Portanto precisamos, sem circunlóquios, deixar claramente registrado que o conceito e prática da Gnose Sagrada que professamos, propomos e divulgamos em nada se refere a invocações, sortilégios e mandingas protetoras, mesmo que encobertas e adornadas sob outras denominações mais exóticas e politicamente corretas.

Também em nada tem a ver com as práticas ditas “espirituais” ou “transcendentais” que de modo apressado e forçante se propõe a revelar o “segredo” da “fast-iniciação”, do domínio e apropriação privilegiada de forças cósmicas sutis, em benefício da sobrevida de nossa já exaurida consciência egóica, assim como do mundo que ela construiu e que está agora destruindo.

Essas práticas visam, mediante a potencialização de estados orgásmico-kundalínicos alterados, transformá-la numa nova-energética-velha-consciência-turbinada. Um banquete para as forças eônicas.

Essas, para os gnósticos cristãos, sempre - desde o princípio - foram consideradas práticas relativas à Authades, o Demiurgo de Platão, o “Príncipe desse Mundo” de Paulo. Assim, não damos a César o que é de Deus bem como não procuramos envolver Deus (nem o Deus gnóstico a isso se presta) nos nossos problemas com César.

A Atualidade do Cristianismo Gnóstico

O Evangelho Gnóstico de Tomé, considerado pela maioria dos acadêmicos como o texto mais antigo do cristianismo, trazendo provavelmente ditos recolhidos diretamente de preleções de Jesus aos seus discípulos, é também aquele que mais se adéqua às genuínas necessidades espirituais da atualidade. Esse profundo e adequado alfa e ômega do cristianismo gnóstico bem se caracteriza pelo dito [10] que ali diz:

“Eu joguei fogo sobre a terra e eis que vigio até que arda”.

E esse fogo agora já arde.

É hora, portanto, de pararmos de brincar com ele. 

Como diz o Bispo gnóstico atual Stephan Hoeller:

“Esse é o tempo em que a Gnósis - o reconhecimento do Verdadeiro Divino - não é mais um luxo, mas uma necessidade absoluta”. 


Rio, 4/10/2009

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