sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Cátaros, Gnósis e Espiritismo – Uma breve abordagem.



Recebi um e-mail de uma amiga espírita descrevendo sua importante tarefa no atendimento a irmãos que foram cátaros. 

Seu grupo espirita ajuda aos irmãos que pereceram naqueles anos de horror, e se encontram no mundo astral em sofrimento: os que morreram enclausurados e asfixiados, por terem se escondido ou fugido, os que se revoltaram com a morte pela espada ou pela fogueira, as mães revoltadas por terem visto seus filhinhos morrerem, enfim, irmãos que agora são chamados à libertação...

Além de descrever mais detalhadamente o importante trabalho que faz a amiga, que leu meus artigos, vídeos e palestra, além de compartilhar o seu trabalho comigo pergunta-me sobre se há trabalhos semelhantes se realizando em grupos gnósticos ou cátaros.

Assim tal contato me dá o ensejo de caracterizar brevemente o escopo de nossos respectivos trabalhos espirituais:

Cátaros, Gnósis e Espiritismo – Uma breve abordagem.

Cara amiga:

Nós, almas encarnantes, vivemos uma experiência eônica de que, como o gnosticismo considera em sua essência e como também é muito bem expresso no budismo, somos almas aprisionadas na roda do nascimento e da morte e nessa experiência: nascer é dor, viver é dor, envelhecer é dor, morrer é dor e renascer é dor. 

A Gnósis Universal situa as almas aprisionadas nessa roda do nascimento e da morte basicamente em três patamares:

As almas hílicas - Totalmente envolvidas na matéria - são as almas cujo objetivo único na vida é possuir, acumular, conquistar as “coisas do mundo”. Materialistas por excelência.

Almas psíquicas - Totalmente guiadas por seu corpo emocional e vivem na ilusão luciferiana de conquista de valores “elevados” da e na matéria, DESSE MUNDO: felicidade, saúde, harmonia... 

Pensam que poderão transformar-se e transformar, até mesmo divinizar, ESSE MUNDO pelo seu aperfeiçoamento. Essas são as almas essencialmente religiosas e que tendem a se entregar totalmente a essas instituições ou a seus livros sagrados e tem seus dogmas e seus líderes temporais como santos ou gurus a serem seguidos cegamente, como eles dizem - em “fé” absoluta. 

Almas pneumáticas - Aquelas que já amadureceram a noção de que o SAGRADO - o verdadeiro DEUS ABSOLUTO - deve ser buscado a partir de um processo em que a vontade humana decaída deve ser substituída, no interior da alma, pela partícula holográfica da VONTADE DE DEUS: “Seja feita a Sua Vontade e não a minha”. E só então há a LIBERTAÇÃO que é a única coisa que interessa a essas almas. 

Semelhante categorização das almas podemos também encontrar na tradição oriental, no Baghavad Gita, que diz: 

"Quatro tipos de pessoas buscam uma conecção Comigo:

1 – Os Cansados do Mundo: Os que veneram a Deus buscando o alívio da agonia física ou mental ou para se livrar dos medos e das adversidades. 

2 – Os Buscadores da Felicidade: Estão buscando felicidade nas coisas do mundo. Os que rezam a Deus para obter riqueza, família, poder, prestígio e assim por diante. 

3- Os Buscadores de Avanços Espirituais: Pessoas cujo motivo para se conectar com a divindade interior é ganhar conhecimento e experiência que ajudem sua auto-realização. [São os buscadores pelo acumulo de conhecimento e por experiência de PICO, uma espécie de “barato espiritual”, com métodos e processos, alguns até com alucinógenos, visando alterações forçantes de seus estados de consciência.]

4- Os que Querem Conhecer a DEUS: Os que verdadeiramente querem conhecer a ATMA, o ‘Self’. Os que sabem que só DEUS existe e cujo único impulso é para o Divino e NADA MAIS."

E o Baghavad Gita continua:

“Desses quatro, o último é o mais elevado porque eles conhecem minha Verdade e estão a mim devotados. Como Eu sou extremamente caro a eles, eles são muito caros a mim.” 

E, o que é importante realçar: 

“Os três primeiros estão ligados aos objetos do mundo ou estados mentais que desejam. Mas certamente todos os quatro tipos são nobres porque qualquer razão para voltar a DEUS os irá, no devido tempo, encaminhar para a transformação espiritual o que é, em última análise, bom.”

Buscando relacionar as citadas caracterizações, ocidental e oriental, poderemos dizer que:

Os hílicos: Embora obviamente sejam de DEUS, AINDA não podem ser categorizados como “buscadores” de Deus. 

Os psíquicos: São os Cansados do Mundo ou os Buscadores da Felicidade.

Os pneumáticos: Relacionam-se com os Buscadores de Avanços Espirituais e, quando finalmente aprumam o rumo de sua “pneumaticidade”, passam a ser os que Querem Conhecer a DEUS. 

O Cristianismo Gnóstico Original, hoje completamente desfigurado pelas instituições “cristãs” encabeçadas pela grande egrégora romana, professa plenamente o: “Meu Reino não é desse MUNDO”; “Vende tudo que tens e siga-Me”; “Busca acima de tudo DEUS e tudo o mais que necessitar lhe será dado em acréscimo”; “Quem são meus pais, quem são meus irmão?”....

Os gnósticos (não os nominalmente, mas os em estado de ser) trabalham á partir do núcleo Divino pneumático interno. E assim só tem a oferecer aos psíquicos e mesmo aos hílicos o seu “Silêncio” a sua “Quietude” em forma de energia Divina transmutada emanada a partir da alquimia realizada pela “partícula Holográfica Divina” renascida no interior de cada alma pneumática.

A palavra, a argumentação, o convencimento que possa partir do gnóstico pneumático não contribuí diretamente para o “consolo” das almas psíquicas e menos ainda das hílicas. Ao contrário a energia e o teor desses enunciados só lhes traz, como é dito no evangelho apócrifo de Tomé, o “Fogo”: “Eu vim trazer o fogo sobre a Terra e aguardo até que arda”.

Os psíquicos em nome de sua “fé” e de seu ‘deus’ (Authades) e os hílicos, por preservação de suas conquistas materiais, reagem violentamente a esse “fogo” e, quanto mais esse núcleo ígneo se estabelece na matéria, não para transformá-la, mas sim para TRANSMUTÁ-LA, mais ocorre a exacerbação dessa violência. 

Historicamente os Cátaros conseguiram estabelecer na região do atual sul da França uma Nação Cátara por mais de duzentos anos na qual os três tipos humanos lograram sob a liderança espiritual pneumática (não política) dos sacerdotes cátaros, se beneficiar de um nível civilizatório sem par no ocidente da época sob uma “re-ligação” que apontava sempre para o verdadeiro espírito de transcendência cristão de “O meu Reino não é desse mundo” e o de “Seja feita a sua Vontade e não a Minha”.

Se essa experiência civilizatória conseguisse se estabelecer definitivamente na história, a civilização cristã ocidental teria feito realmente jus a esse nome.

Exatamente por esse imenso “risco” ao estabelecimento político e religioso da época, representado respectivamente pelo Príncipe dos psíquicos o papa Inocencio III, e pelo Rei hílico frances Felipe Augusto, se mobilizou militarmente como nunca antes, o que culminou com a maior carnificina até então ocorrida de ocidentais contra ocidentais - A Cruzada contra os Albigenses, (1209 a 1244) - que dizimou os cátaros levando ao ocaso a até então florescente cultura languedociana e à formação de um novo espaço geopolítico na Europa ocidental, e que teve também, como consequência, a instituição da inquisição romana na Europa. 

É emblemático o episódio de 21 de julho de 1209, quando os cruzados posicionaram-se diante de Béziers e Simão de Montfort à frente do exército cruzado atacou a cidade e exterminou uma parte da população sem levar em conta a sua filiação religiosa pronunciando a famosa ordem de comando: “Matai-os todos, deus reconhecerá os seus”.

O trabalho espiritual pneumático Gnóstico e Cátaro exercido em quietude e introspecção e não em proselitismo, atinge os psíquicos com um fogo silencioso, mas muito intenso purificador e transmutador. 

Nesse sentido as almas psíquicas que, encarnadas ou não, ficam encapsuladas no seu próprio enredamento anímico, envolvidas em relações emocionais pessoais, retidas na falsa eternização dos transitórios papeis de pais, mães, filhos ou quaisquer outras laços emocionais de uma encarnação, e com isso caem num tal nível de desestruturação, devem mesmo ser transitoriamente afastadas da intensidade desse referido “fogo transmutador” pneumático. 

Assim sendo serão bem mais eficientemente assistidas e recuperadas pela mais suave energia do verdadeiro amor que lhes seja pessoal e coloquialmente dirigido por um procedimento de uma verdadeira, e hoje em dia infelizmente cada vez mais rara, atuação religiosa voltada para assistência direta á imensa comunidade dos psíquicos sofredores. 

Por isso amiga o seu trabalho e o de outros poucos como você deve mesmo se exercer no nível desse seu nobre espiritismo e que, para as circunstâncias em que essas almas se encontram, será mais eficiente e apropriado do que o que os Cátaros e os Gnósticos poderiam fazer. 

Quando um agudo acidente desconfigura significativamente as estruturas da alma ou do corpo devemos chamar o atendimento de “médicos socorristas” especializados que conseguem ir até ao acidentado, ministrar-lhe os respectivos procedimentos de terapia intensiva e só desse modo restaurar-lhe a capacidade de reação e recuperação vital. 

Mas devemos sempre ter em conta que assim fazendo não o estaremos curando, mas tão somente o reequilibrando, dando-lhe de volta a sua vitalidade natural. 

E assim, depois de restaurada pelo socorro pessoal amoroso, a alma psíquica deve seguir seu caminho cósmico normal pelos estágios citados pelo Baghavad Gita, e, por fim, quando encontrar “qualquer razão para voltar a DEUS irá, no devido tempo, se encaminhar para a transformação espiritual”: 

A cura da Queda, a saída da roda de Samsara, o retorno do Filho Pródigo,

A VERDADEIRA E DEFINITIVA CURA. 

Paulo Azambuja