Interlocutor: É por isso que eu quero saber qual ação que o passado
produziu como causa dessa cegueira. Certamente seria muito reconfortante.
Krishnamurti: Então você quer conforto, não compreensão.
I: E não são a mesma coisa? Entender é encontrar consolo. De que serve
a compreensão se não trouxer o consolo?
K: Entenda um fato que pode ser bastante inquietante - a compreensão não
precisa necessariamente trazer felicidade. O que você quer é conforto, é isso
que você está procurando. É perturbado pela doença de seu filho e quer algo
para lhe dar a paz. Chama a essa tranquilidade que busca de compreensão, mas o que o impulsiona não
é para compreender, mas sim para se sentir confortado, e tem como objetivo
encontrar uma maneira de acalmar a sua perturbação, e você chama isso de ‘buscar
a causa’.
Seu maior desejo é que o entorpeçam, é ficar quieto, e sua intenção é
achar uma maneira de apaziguar esta perturbação. Encontramos muitas maneiras de
adormecer: através de Deus, dos rituais, dos ideais, das drogas, etc. Nós fugimos
da perturbação, e um dos escapes é a busca pela causa.
I: Por que não se iria querer estar
livre da ansiedade? Por que não deveria querer evitar o sofrimento?
K: Por acaso a evasão impedirá
que se sofra? Você pode fechar a porta para o desagradável, para o medo, mas
ele ainda estará lá atrás da porta, não é? Aquilo que se reprime, aquilo a que
se põe resistência não é entendido, certo? Você pode suprimir ou disciplinar
uma criança, mas com certeza isso não a ajudará a entender. Você esta buscando a causa a fim de evitar a dor da perturbação,
com essa intenção você busca e, naturalmente, vai encontrar o que busca.
Mas somente é possível se livrar
do sofrimento quando você olha para o processo do sofrimento, quando você
percebe cada uma de suas fases e percebe toda a sua estrutura.
Evitar o
sofrimento só o intensifica.
A explicação da causa não é a compreensão da causa.
Mediante a explicação não nos
livramos do sofrimento; o sofrimento segue existindo só que agora encoberto com
palavras, com conclusões, quer sejam próprias quer sejam de outrem.
O estudo das explicações não é o
estudo da sabedoria, a sabedoria só é possível quando explicações cessar. Você
está buscando ansiosamente explicações que o adormeçam e as achara; mas a explicação não é verdade.
A
verdade vem quando há observação sem conclusões, sem explicações, sem palavras.
[Até aqui os ensinamentos de K]
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(*)Veja também nesse blog:
[Até aqui os ensinamentos de K]
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Passo agora a fazer umas observações:
Vamos partir do: “Dai a César o que é
de César...”
Todos nós vivemos aqui a Vida-de-César e devemos ter muito respeito e cuidado com ela.
Essa Vida-de-César é essencialmente atrito num recorrente nascer, crescer,
envelhecer morrer..., como nos ensina a roda de Sansara do budismo.
Certamente esse desgaste vai deixando
suas marcas tanto físicas como psíquicas e temos que, temos mesmo a obrigação
de, recorrer aos paliativos que se
façam necessários para mitigar essas “dores” buscando na nossa cultura os recursos
de alívio necessários.
Aqui temos o espaço legítimo da medicina
tanto quanto nos alivia, por exemplo, com a receita desses óculos, sem o qual não poderia nem
mesmo estar escrevendo essas notas, e depois passando pelo tratamento para lenitivos ou
superação de outras inevitáveis pequenas, médias e grandes mazelas, chegando até mesmo a uma bem vinda
assistência e conforto físico na hora da morte.
Aqui também nos casos psíquicos cabe
perfeitamente o espaço de utilidade da psiquiatria e da psicologia na promoção
de um, muitas vezes impossível sem sua ajuda, reequilíbrio interno e social de
nosso ego, de nossa Vida-de-César psíquica.
Lembremos que sem nem mesmo termos um ego relativamente ajustado nenhum
processo visando sua superação ou transcendência (ou como quer que o queiramos denominar) pode ser realizado.
Para que o ego seja (ou se) “entregue”
é evidentemente necessário que antes de tudo haja um ego funcionalmente
razoável.
No entanto, apareceu um grande
equívoco que é o de se pensar que todo o problema humano, não só o pessoal como
como de toda a espécie, é da
categoria desses ego-problemas gerados na e por essa Vida-de-César que, para a ciência
materialista já impregnada na nossa cultura comum É TUDO O QUE SOMOS.
E é no burburinho da confusão desse
grande equivoco que a proposta de Krishnamurti e de muitos outros Homens de Gnósis (homens de sabedoria espiritual) esbarra num pseudo e sofismático
mal entendido.
As primeiros a gerarem esse engano
foram, num erro de avaliação do escopo e da categoria de seus limites, as pretensões de CURA da
condição psíquica humana que os arautos da psicanálise (Freud e também Yung,
mesmo que em um outro nível bem mais profundo de abordagem), proclamaram ou
pelo menos induziram, respirando ainda a grande e pretenciosa ilusão racionalista
dos fins do sec. XIV.
Isso porque, dando conclusão à frase
que começou esse adendo temos: “Daí a César
o que é de César e a Deus o que é de
Deus”
Em
todo o seu ensinamento Krishnamuiri só fala, em CURA, e como esta falando no texto acima, em CURA PSÍQUICA - DA ALMA, fundamental para a Volta à Casa do Pai, à Vida-em-Deus.
E para a Vida-de-César o voltar se,
como faz o Filho Pródigo, para o Retorno à Casa do Pai ou o Retorno à Vida-em-Deus
é LOUCURA.
E para o ego que: “Deve diminuir
para que o EU [o Outro] possa crescer” ou que é aconselhado: “Vai larga tudo que tens e segue-me”, essa LOUCURA
QUEIMA.
Como é dito no Evangelho Gnóstico de Tomé
“Eu
lancei fogo sobre a terra [e sobre cada homem] e aguardo até que arda” (*)
Quem não entender e distinguir profundamente isso vai discutir com Krishnamurti inconclusivamente à exaustão.
Paulo Azambuja
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